Esporte
tem o dogma de fazer amizades
Por Eduardo Cedeño Martellotta
A FPT representa
cerca de 10 milhões de truqueiros em todo o Estado de São Paulo, amantes do truco,
esse fascinante jogo de baralhos caracterizado pelo grito durante as partidas.
Thame
explica que atualmente em 80% do Brasil se joga truco. “De cada dez caipiras,
onze são campeões de truco”, costuma dizer.
Copa Campo Limpo de Truco, último torneio realizado pela FPT
O
truco, segundo ele, tem o dogma de entrelaçar as pessoas em clima de pampeirismo,
formando novos amigos. Hoje muitos universitários jogam o truco. “O truco nasceu
na palhoça, ganhou o asfalto, entrou na faculdade e virou doutor”, diz Thame. O
esporte tem outra vantagem, a de integrar todas as classes sociais. “Ele
mistura funileiros, engraxates, advogados e médicos. É uma farra organizada”,
conta.
Durante
as partidas, que acontecem em dupla ou trio, predomina a cordialidade entre os
jogadores. “O truqueiro respeita o outro”.
São Paulo, Paraná, Minas
Gerais, Goiás, Distrito Federal, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Santa Catarina
são os estados onde mais se joga truco, segundo ele. Existem, além da FPT,
as outras federações nos respectivos estados. E, em menor quantidade, o truco
se espalha ainda pelo interior dos Estados da Bahia e do Rio de Janeiro.
Equipe de árbitros da FPT com Milton George Thame
Paixão pelo truco vem da infância
A
paixão de Thame pelo truco surgiu aos seis anos de idade. Ele viajava com o
pai, mascate, na garupa de um cavalo, que costumava comercializar tecidos, em
forma de permuta. “Voltávamos carregados de peixes, cabras e cabritos amarrados
no cavalo. Meu pai cantava para mim, no caminho, e eu dormia nas costas dele.
Ao chegar num lugar, ele cumprimentava as pessoas e tomava pinga de alambique.
A imagem não sai da minha cabeça. As mulheres preparavam a comida: pedaços de
leitoa, em fogão de lenha. Enquanto isso, jogavam truco e eu ficava assistindo.
Eles usavam milho para marcar os tentos da partida. Aí eu ficava fascinado pelo jogo”, lembra
ele.
Com
o passar do tempo, o pai o ensinou a jogar truco. “Certa vez ele me disse: um
dia você vai cuidar do truco”.
O
boituvense Thame começou a jogar truco aos 12 anos de idade com o próprio pai
que lhe ensinou, apenas com o objetivo de fazer amizades. Por volta de 1959,
foi morar em São Paulo, no bairro do Tatuapé, quando começou a frequentar clubes
de bocha, malha e truco, onde tinha o costume de marcar o nome e o endereço de
todos os amigos. “Parece que eu estava fadado a fundar um dia uma instituição
em prol do truco”. Thame se recorda que,
embora fosse um jogo de diversão, em alguns lugares o truco era proibido.
Em
1977, ele participou do 1º Campeonato Estadual de Truco, promovido pela atual
Secretaria de Esporte, Lazer e Juventude. No ano seguinte, sagrou-se campeão. “Isso
me deu a força e os instrumentos para fundar a federação”. Naquela época, Thame
acumulava as funções de jornalista, policial militar e assessor do então
Secretário da Segurança Pública, Erasmo Dias.
Em
1980, fundou a Associação Paulista de Truco (hoje FPT), com repercussão
nacional. Milton Thame
tinha na época uma página inteira sobre o truco no jornal A Gazeta Esportiva ,
publicada às quartas-feiras e aos sábados.
Dois
anos depois, o saudoso vice-governador Orestes Quércia, muito prestimoso com a cultura nacional ,
deixou a Secretaria Estadual de Esporte à disposição de Thame para que cuidasse
do truco. “Lá eu fiz um trabalho muito grande em prol do truco”.
Jornal do Truco: Sucesso Nacional
Em 1984, Thame resolveu fundar
o Jornal do Truco. “Foi um bombardeio. Todos os estados brasileiros recebiam o
jornal, principalmente as Prefeituras e Câmaras Municipais”, lembra ele.
O
Jornal do Truco, com circulação mensal, não era só truco, abordava ainda bocha,
malha, pesca, moda de viola e turismo. Em razão de problemas de saúde, ele
parou a circulação do jornal em 1996. Mas anuncia que o jornal irá voltar em breve. “Haviam
falecido dois companheiros meus, o editor Claudio Maiato e Onofre Leite, ambos
do Jornal do Brás
(em cuja sede também funciona a FPT) e do Jornal do Truco. Fiquei com os dois
jornais sozinho, e quando realizei minha segunda cirurgia no coração, não tinha
mais condições de tocar os dois veículos”.
O maior público do truco
Desde
a sua fundação há 25 anos, a Federação Paulista de Truco promoveu centenas de
campeonatos. O maior deles foi o Estadual de Prefeitos e Vereadores, em 1990,
no Mart Center da Vila Guilherme. “Participaram 412 prefeitos e 3.700
vereadores de todo o Estado de São Paulo. E também vieram muitas caravanas de
truqueiros do interior, totalizando 19.000 pessoas. Foi uma loucura. Jamais
alguém vai fazer um campeonato de truco dessa envergadura”. Thame atribui o sucesso
a uma promoção bem atrativa, oferecendo cachaça, chopp e churrasco grátis a
todos os participantes. Foram três dias de evento. “Foi um pedido do então
governador Orestes Quércia para ajudar o Fleury Filho a ser eleito. E foi
graças ao truco e à FPT que Fleury conseguiu se eleger governador, fato
confirmado depois por Quércia”, ressaltou.
Volkswagen, Copag (empresa
fabricante de baralhos), Kaiser e Brahma foram os principais colaboradores da
FPT. A Copag até hoje dá suporte à entidade com o fornecimento de baralhos. “Promovemos
ainda um campeonato bem interessante para mecânicas e funilarias através da
Volkswagen”, lembra Thame.
Regras do jogo
Aprender
a jogar truco é fácil e rápido, garante ele, basta assistir a uma partida. Em
relação às regras, as cartas obedecem a uma hierarquia de manilhas, valores e
símbolos: paus, copas, espadas e ouro. “Se virar um cinco na mesa, ou seja, um tombo, as manilhas são o seis. O seis de
paus é o zap, o seis de copas é
chamado de sete copas, o seis de espadas é espadilha e o seis de ouro chama-se pica fumo. Depois vêm as cartas de menor
valor: os três, os dois, os azes
etc”.
O
truco em um dia especial, criado em 1986, pelo então deputado Augusto Toscano –
o Dia do Truco,
comemorado por lei estadual no segundo domingo de julho de cada ano.
Thame
salienta que a FPT está rigorosamente em dia perante o fisco municipal,
estadual e federal. Realizou a Copa Campo Limpo de Truco em 29 de
setembro de 2012. “E estamos trabalhando junto a outras subprefeituras da Capital para
promover campeonatos nos bairros, em seus respectivos aniversários. Enquanto
aguardamos também a Secretaria Municipal de Esportes, Lazer e Recreação para
convidar a FPT a coordenar novamente os Jogos da Cidade, a Taça Cidade de São
Paulo e a Virada Esportiva”, explica.
A Federação Paulista de Truco
foi fundada na rua Piratininga, 841, e hoje está sediada na rua Rio Bonito, 104,
bairro do Brás. O site da FPT é www.trucofpt.com.br,
que contém a Cartilha do Truco
e o Regulamento. Venha se filiar e jogar truco. Mais informações pelos fones
2692-6694/0081.
Jogo é Recreação Milenar
O truco
é uma recreação milenar. A origem, segundo Milton George Thame ,
é desconhecida. Alguns afirmam que veio da Itália, com o baralho italiano,
outros dizem que surgiu na Espanha (baralho espanhol) ou em Portugal
(espadilha).
O desenvolvimento se deu no Brasil no final do
século XIX, por volta de 1890, quando da vinda dos imigrantes italianos e
espanhóis, que traziam o baralho de truco no bolso, como diversão. Eles
desembarcaram no Porto de Santos, chegando na Hospedaria dos Imigrantes, no
bairro do Brás. “Uns preferiram ficar no Brás, outros foram contratados pelos
capatazes nas fazendas do interior dos Estados de São Paulo, Minas Gerais e Paraná,
levados como mão-de-obra”, conta Thame.
A palavra truco vem do italiano trucco, que significa truque, artimanha e catimba. O jogo é caracterizado pelo grito. “É o momento do blefe. O truco é hereditário, folclórico, eletrizante, e cheio de misticismo e de manhas. O grito é uma forma do jogador de ganhar a partida. O jogo domina o sorriso, quebra o gelo, protocolos e guerras. Desmancha intrigas. Faz as pessoas inimigas se abraçarem. O truco tem o dogma de fazer amizades”, explica o presidente Thame da FPT, finalizando a entrevista.