Conto - por Eduardo
Cedeño Martellotta
O ano,
1967. Dia chuvoso. Em tradicional ponto de encontro dos rapazes e garotas para
o “footing”, a Avenida Celso Garcia, lá está Amarildo, guarda-chuva na mão, na
porta do Cine Roxy, no número 499, disposto a assistir o filme “O Vale das
Bonecas”.
Encontra-se
acompanhado do amigo Rogério. Compram as entradas, duas pipocas e duas garrafas
de Crush, e adentram o cinema.
Chegando
nos assentos, observam pouco público para assistir a sessão, que começa às
19h40. Apenas duas garotas jovens, que logo chamam a atenção dos dois.
Esbeltas, bonitas, uma loira e outra morena.
Amarildo
e Rogério se aproximam das meninas. Rogério pergunta:
- Com
licença, nós podemos sentar ao lado de vocês?
-
Claro, rapazes – responde a loira, de nome Evelin.
Dentro
de instantes, começa o filme. Rogério e o amigo Amarildo, que mora no Brás, na Rua
Silva Teles (Rogério é morador da Vila Matilde), estavam mais interessados nas
garotas do que no filme. Oferecem a pipoca e o refrigerante às garotas, que logo
aceitam.
O
filme está rolando. É um drama estadunidense, grande sucesso de bilheteria mas
um grande fracasso de crítica, onde o final do filme é totalmente diferente do
livro de mesmo nome, um best-seller escrito por Jacqueline Susann. Fala sobre
três jovens mulheres aspirando a uma carreira bem-sucedida, que se encontram em
Nova Iorque. Neely, Jennifer e
Anne tornam-se amigas rapidamente, compartilhando os laços de ambição
profissional e a tendência de se apaixonar pelos homens errados. O filme aborda
o uso de pílulas, drogas e barbitúricos para dormir. Aliás, um final trágico.
Nada interessante para os quatro que estavam dentro do Roxy.
Rogério
se interessa por Evelin, a loira, e Amarildo, por Tatiane, a morena. Ambos
casais vão sentar em lugares distantes, já que havia pouquíssima gente no
cinema, devido à chuva que caíra naquele dia. Entre amassos e beijos, o filme
vai sendo exibido, até que às 21h43 termina a sessão.
Os
casais saem de mãos dadas. Rogério e Amarildo resolvem levar as garotas à
Lanchonete Garoto, nas proximidades. Lá saboreiam um lanche e batem mais papo
com as moças. Deixam seus contatos com elas, com a promessa de haver novos
encontros.
Por
sorte, Amarildo e Tatiane moram no Brás. Já Rogério não tem a mesma coincidência,
pois Evelin mora em Santo André.
Está
tarde. O relógio marca 23h. Amarildo, jovem como Rogério – ambos têm 25 anos de
idade e são amigos de infância da mesma Rua Cachoeira em que moravam, resolve
então fazer um convite à Tatiane:
- Quer
ir comigo até a minha residência, Tati?
Ela
responde: - Estou cansada, vamos deixar para outro dia?
Tatiane
trabalha como atendente e vendedora nas Lojas Pirani, da Celso Garcia e reside
na Rua Almirante Barroso. Amarildo trabalha no Centro Velho, Avenida São João,
como assistente administrativo do Banco do Brasil.
O
morador Rogério da Vila Matilde, por sua vez, toma a condução para o Tatuapé,
onde ali pegaria outro ônibus para a zona leste. Trabalha como almoxarife em
uma indústria de pentes e botões na Rua Behring, Brás. Seu footing, Evelin, está
desempregada, mas conhece Tatiane desde criança. Ambas estudaram no Grupo
Escolar Romão Puiggari, também do Brás. Evelin pega o trem para Santo André na
Estação Roosevelt, Avenida Rangel Pestana, onde está a Porteira do Brás.
Assim termina a noite de quinta-feira para os dois amigos
Amarildo e Rogério. Eles sempre marcam para irem ao cinema, às quintas-feiras.
Tempos que não voltam mais, que marcam uma época de romantismo, paquera e
boemia, em uma Celso Garcia que não existe mais. Hoje, 2019, está tomada por
vários templos evangélicos, cortiços e imigrantes de várias nacionalidades.